terça-feira, 2 de janeiro de 2018

O Polvo

A história política recente do Brasil tem se repetido à revelia do povo. Quando falo recente, refiro-me aos últimos dois séculos.

Você, jovem que nasceu ontem, não pode saber de nada se não estudar. Quando ficar mais velho, vai botar a mão na cabeça e dizer, mas como eu era idiota.

Pois bem, você que saiu nas ruas a gritar "fora Dilma" ou "Lula ladrão", devia saber pelo menos sobre a história da aviação no país chamado Brasil.

Pois que, depois que você conseguiu tirar Dilma e está quase conseguindo tirar Lula também, ganhou de presente a venda da Embraer, a terceira maior fábrica de aviões do mundo, pelo governo do golpe que substituiu a presidenta por sua causa.

Se você não tivesse faltado às aulas de história na escola, talvez esta não se repetisse assim tão cedo.

Pois que, anos atrás aconteceu a mesma coisa, a indústria aeronáutica brasileira foi destruída do mesmo jeito. A história se repete.

Pois veja só esta estória que se desenrola a seguir, para lhe embalar o seu sono neste amanhecer de um novo ano.

O artigo é do Jornal GGN, mas resolvi dar uma ajeitadinha para tentar enfatizar alguns pontos.

Portanto, o original está aqui, Sob Controle da Boeing, Destino da Embraer É o da FNM, por Luiz Carlos Lima, professor e ex-secretário de educação de São José dos Campos, em 24/12/2017:

https://jornalggn.com.br/noticia/sob-controle-da-boeing-destino-da-embraer-e-o-da-fnm-por-luiz-carlos-lima

Ao contrário do que pensa a maioria das pessoas, a Embraer não foi a primeira incursão de grande envergadura no campo aeronáutico, feita pelo Brasil. 

Nascimento da Fênix

Em 1942 o governo do presidente Getúlio Vargas, sob a inspiração do então coronel Guedes Muniz, criou a Fabrica Nacional de Motores (FNM) em Xerém, distrito de Duque de Caxias no Rio de Janeiro. A idéia era produzir motores de aviação para viabilizar a nascente indústria aeronáutica que era obrigada a importar os motores que, com a prolongada segunda guerra mundial, tornara-se artigo raro e caro.


A aliança entre Vargas e Roosevelt, então presidente dos Estados Unidos, permitiu a viabilização da fábrica, juntamente com a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em troca da instalação de uma base em Natal, no Rio Grande do Norte.


Avião Vultee A-31/A-35(V-72) Vengeance - Brasil
Os primeiros motores produzidos pela FNM foram uma versão dos motores radiais Curtiss-Wright R-975 e equiparam um avião Vultee em 1946. 

É importante lembrar que o Brasil contava à época com 3 fábricas de aviões, uma em Lagoa Santa, Minas Gerais onde foram montados os T-6, a Fábrica do Galeão no Rio de Janeiro, que produziu os bombardeios bimotores Focke-Wulf B 52, e uma indústria privada, a Companhia Aeronáutica Paulista, que produziu os famosos aviões Paulistinhas. 


Portanto, produzir motores era essencial para a capacidade do país se defender e garantir sua soberania, especialmente num cenário internacional como da segunda guerra mundial.


Aviões T6 montados no Brasil na década de 40 na equipe da
Esquadrilha da Fumaça
A Vaca Vai pro Brejo

Findo o conflito, nosso aliado americano tinha grande sobra de material de guerra, inclusive motores de aviação. Por outro lado, Getúlio Vargas já havia caído e com ele sua política nacionalista. 

O novo governo do presidente Eurico Gaspar Dutra, de inspiração liberal (direita), eleito em 1946, optou por abandonar o esforço em dominar a produção de motores de aviação e comprar a preços módicos o estoque norte-americano.


Morreu aí a FNM produtora de motores de aeronaves. 


Hoje os aviões produzidos no Brasil importam seus motores de fábricas inglesas ou norte-americanas.


Renascimento da Fênix

Mas as primorosas instalações da FNM em Duque de Caxias não foram fechadas. Lá o coronel Guedes Muniz iniciou a produção de bens de consumo, máquinas agrícolas e finalmente caminhões. Primeiro fez uma associação com a Isotta Fraschini e posteriormente com a Alfa Romeo, ambas fábricas italianas, para a produção de caminhões pesados no Brasil.

Caminhão FNM totalmente brasileiro na década de 60
Aos poucos se tornou uma marca reconhecida em todos os cantos do país com caminhões adaptados às condições brasileiras que dominaram nossas estradas nas décadas de 1950 à 1970.

Além dos caminhões pesados, a fábrica produzia ônibus e em 1960 lançou um automóvel sedã bastante avançado, o FNM 2000 JK em homenagem ao presidente Juscelino Kubitschek. 


Era uma autêntica marca nacional – apelidada pelo povo de FeNeMê.


Apesar do fracasso inicial com a produção de motores aeronáuticos por decisão governamental alinhada aos interesses geopolíticos dos Estados Unidos, a FNM firmou-se como um símbolo da industrialização brasileira concebida no ciclo Vargas – com forte ação do Estado: Petrobras, Companhia Siderúrgica Nacional, FNM e Vale do Rio Doce.


Automóvel FNM JK 2000 sob licença da Alfa Romeo italiana
A Vaca Vai pro Brejo de Novo

Veio o golpe militar de 1964 e colocou uma pá de cal na marca brasileira de automóveis, caminhões e ônibus. 

Em 1968, em negociação secreta, o governo do marechal Costa e Silva transferiu o controle da FNM de vez para a italiana Alfa Romeo – até então parceira tecnológica da empresa. A marca desapareceu em uma década.


Nunca mais o Brasil conseguiu consolidar uma marca própria competitiva no ramo automobilístico, apesar do esforço de gente como João Gurgel, Agrale e das fábricas de esportivos e utilitários. 


Hoje o mercado brasileiro é dividido entre multinacionais de várias origens – norte americanas, suecas, alemãs, japonesas, francesas, coreanas, francesas, chinesas....


Renascimento da Fênix de Novo

O Brasil detém uma das três grandes indústrias de aviões do ocidente, a EMBRAER, fruto de uma visão cuja origem é a velha política nacionalista de Getúlio Vargas, implantada com o Brigadeiro Montenegro, criado do CTA e ITA, que permitiu a constituição do grupo de trabalho que resultou na produção dos aviões Bandeirante e Embraer.

A Vaca Vai pro Brejo 3

De novo, um governo de direita, desta vez não militar, resolve acabar com a indústria nacional altamente lucrativa, apenas para riscar o Brasil do mapa dos concorrentes norte-americanos, mantendo o país sempre escravo, dominado, inerte, impotente, inviável.

E o povo? O polvo (como distorce o filme Eu Sei que Vou te Amar, de Arnaldo Jabor)? Que é isso?

Governos de direita fazem parte das elites nacionais. As elites são ricas e não são "povo".

O rico brasileiro de verdade já desistiu do Brasil, diz Hildegard Angel, colunista social. Está pouco se lixando se tem gente pobre, vivendo e defecando nas ruas. Não é que ele seja insensível, é que ele não vive aqui. Ele está por aqui. Tem seu apartamento à beira mar, frequenta seu clube, onde joga tênis, convive com seu reduzido círculo de amigos e ponto. Depois, embarca no seu jato para a residência lá fora. O Brasil é para ganhar dinheiro e remeter dinheiro. Este rico não tem mais o embaraço da língua, como alguns ricos de gerações anteriores, pois os filhos e netos já dominam o Inglês desde que nascem e sequer conhecem a nossa História. O rico brasileiro é globalizado, não tem brio patriótico, ao contrário, sente bastante preconceito e desprezo em relação ao nosso país, onde lamenta ter nascido. Existem, naturalmente, as raras exceções, por isso mesmo, louváveis.



Assista o filme completo aqui, em péssima resolução. É um filme raro e complexo, mas tornou-se outro símbolo do casal do qual faço parte, pois adoramos quando o assistimos e jamais o esquecemos. É de um tempo em que Arnaldo Jabor ainda não tinha se vendido à Globo.



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