segunda-feira, 18 de abril de 2016

Zoológico Nacional

Texto publicado por Pablo Villaça no Facebook, recebido via WhatsApp.

No momento em que escrevo este texto, 21h17 do dia 17 de Abril de 2016, o placar da votação na Câmara se encontra 252 a 81 a favor do golpe. Não há como negar o óbvio: perdemos. Eles terão no mínimo 360 votos.

Até agora, o que as câmeras no plenário exibiram foi um show de hororres: deputados que parecem pregar em um templo e que justificam seus votos dedicando-os a "Deus", à suas famílias, "aos cristãos", "aos maçons" (juro), "pelo direito de ir e vir" (hã?!) e, principalmente "contra a corrupção".

Votam "contra a corrupção" para removerem uma presidenta que não foi acusada de crime algum e para colocarem, em seu lugar, Michel Temer e Eduardo Cunha. Votam "contra a corrupção" ignorando, entre outras coisas, que deveriam estar votando as tais "pedaladas fiscais".

É sintomático, aliás, que apenas uns cinco ou seis deputados tenham mencionado as "pedaladas" em seus votos; ora, por que deveríamos esperar o contrário? Afinal, eles estavam julgando exatamente isso, não? Teve até deputado que, num ato falho perfeito, disse estar "cassando o Brasil em nome do Pará". Teve menção a Olavo de Carvalho. Teve voto contra a "ditadura comunista" (reparem: voto contra a ditadura).

Muito bem... show de horrores à parte, o fato é que perdemos. E agora, o que acontece? Desespero? Pânico? Dores incapacitantes?

Nada disso. Ao contrário do que muitos deputados disseram durante seus votos (indicando seus despreparos para a tarefa), a Câmara não julgou o processo de impeachment, mas a aceitação de que está seja enviado para o Senado. Quem decide se o processo será admitido e, então, julgado, são os senadores.

Os próximos passos são a formação de uma comissão no Senado para emitir um parecer sobre o processo - parecer que será julgado e terá que obter maioria simples (ou seja: 41 dos 81 senadores).

Dilma, então, perderia o cargo? Não. Seria afastada por 180 dias enquanto defesa e acusação são preparadas e apresentadas no Senado. A seguir, o processo seria enfim julgado, precisando obter 2/3 de aprovação (54 dos 81 votos) para que Dilma sofra o impeachment.

Em outras palavras: o golpismo venceu uma batalha importante, mas definitivamente não venceu a guerra.

A partir de agora, tomar as ruas se torna ainda mais fundamental. É preciso que se torne impossível, pro Senado e pra mídia, ignorar nossas vozes (embora a mídia certamente vá tentar ao máximo). Além disso, há um elemento positivo na votação de hoje: os discursos dos deputados pelo “sim”. Como apontei acima, ficou transparente que não julgaram as “pedaladas”, mas questões ideológicas, religiosas e financeiras.

Não há mais como negarem a natureza golpista do que fizeram - houve até deputado dedicando seu voto pelo sim aos militares de 64.

O espetáculo na Câmara hoje foi tão grotesco que o único efeito possível é mobilizar de vez quem luta contra o golpe. Para completar - e isso é muito importante -, eles estão ignorando algo fundamental e que representa um elemento perigoso aos seus propósitos golpistas: os movimentos sociais, trabalhistas e das periferias.

E se posso fazer uma previsão é a de que estes se tornarão maiores e mais fortes. Outra coisa impossível de ignorar.

O dia 17 de Abril de 2016 entra pra História do Brasil como uma mancha. Mas tenhamos orgulho por saber que persistimos do lado certo.

Portanto, lindezas, lambam as feridas hoje. Chorem. (Eles não adoram dizer que "o choro é livre”? Aproveitemos a generosidade deles.) Esmurrem as paredes. Digam palavrões enquanto tomam banho. Quebrem um prato ou um copo (só um; lembrem-se de que terão que catar os cacos depois e isso é um saco). Só não entrem em brigas ou trocas de insultos, pois isto não é produtivo e somos, afinal, seres racionais.

Em seguida, ergam a cabeça, respirem fundo e olhem adiante. Este caminho que estão vendo à sua frente significa algo fundamental: que a luta continua.

Pablo Villaça, https://www.facebook.com/pablovillaca01/posts/810197059085522

Globo

Duas reportagens da Globo, Jornalistas Estrangeiros no Brasil Comparam Reviravoltas na Política a Roteiro de Novela. Apesar disso ser uma profunda crítica estilo zombaria, a Globo gostou porque a novela é dela:

http://globoplay.globo.com/v/4963917/ 

Miriam Leitão Comenta Futuras Relações do Governo com o Congresso. Ora, ora, Alexandre Garcia chamando a atenção para os traidores do povo que se mancaram para o congresso a fim de votarem afogueadamente, esquecendo-se das suas funções! Deram as costas ao povo para servirem a outro senhor, em outro poder! Dei risada quando ele disse que a maioria declarou o voto pela família, pela mulher, pelos filhos, pelo cachorro, mas esqueceram dos eleitores! Então os ministros não podem assumir, mas os assumidos podem deputar? É um verdadeiro zoológico estilo Ópera Bufa, programa realidade que o mundo resolveu assistir de camarote antes das Olimpíadas que são suas reais preocupações:

http://globoplay.globo.com/v/4963921/ 

The Guardian

Dilma Rousseff: Congresso Brasileiro Vota para Impedir a Presidenta

Governo teve que assumir que a Câmara dos Deputados esmagadoramente apoiou o movimento para remover Rousseff, que agora enfrenta votação no senado

Assista ao vídeo explanatório "Dilma Rousseff Enfrenta o Impeachment" [com uma trilha sonora inspiradora e representativa da gravidade do assunto, inserção minha].

Por Jonathan Watts, correspondente em Brasília para a América Latina, segunda-feira 18 de abril de 2016

A presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, sofreu uma derrota esmagadora no domingo, quando um congresso hostil e contaminado por corrupção votou pelo seu impeachment.

Em uma sessão turbulenta da Câmara dos Deputados presidida pelo inimigo do presidente, o presidente da Câmara Eduardo Cunha, a votação terminou na noite de domingo à noite, com 367 dos 513 deputados que apoiaram o impeachment - confortavelmente além da maioria de dois terços dos 342 necessários para fazer avançar o caso para a instância superior.

Uma vez que o resultado ficou claro, José Guimarães, o líder do Partido dos Trabalhadores na Câmara, admitiu a derrota com mais de 80 votos ainda para serem contados. "A luta agora é nos tribunais, na rua e no Senado", disse ele.

Quando o voto fundamental número 342 foi lançado pelo impeachment, a câmara irrompeu em aplausos de "Eu sou Brasileiro", o canto de futebol que se tornou o hino do protesto anti-governo. Os gritos da Oposição dizendo "golpe, golpe, golpe" foram abafados. No meio das cenas estridentes a figura mais impassível na Câmara era a do arquiteto da demolição política, Cunha.

Vigiada por dezenas de milhões de pessoas em casa e nas ruas, a votação - que foi anunciada deputado a deputado - viu a oposição conservadora confortavelmente assegurar o seu movimento para remover a chefe de Estado eleita a menos de metade de seu mandato. Houve sete abstenções e duas ausências, e 137 deputados votaram contra a medida.

Uma vez que o Senado concordou em levar pra frente o movimento, o que provavelmente acontecerá dentro de algumas semanas, Rousseff terá que se afastar por 180 dias e o governo do Partido dos Trabalhadores, que governou o Brasil desde 2002, será pelo menos temporariamente substituído por uma administração de centro-direita liderada pelo vice-presidente Michel Temer.

Em uma noite tenebrosa, sem dúvida, o ponto mais negro foi quando Jair Bolsonaro, o deputado de extrema-direita do Rio de Janeiro, dedicou seu voto a favor do impeachment a Carlos Brilhante Ustra, o coronel que liderou a unidade de tortura Doi-Codi durante a época da ditadura. Rousseff, ex-guerrilheira, estava entre aqueles torturados. O ato de Bolsonaro impeliu o deputado de esquerda Jean Wyllys a cuspir em sua direção.

Eduardo Bolsonaro, seu filho e também um outro deputado, usaram seu tempo ao microfone para homenagear o responsável geral pelo golpe militar de 1964.

Os Deputados foram chamados um por um para o microfone pelo instigador do processo de impeachment, Cunha - um conservador evangélico que é ele próprio acusado de perjúrio e corrupção - e um por um eles condenaram a presidente.

Sim, votou Paulo Maluf, que está na lista vermelha da Interpol por conspiração. Sim, votou Nilton Capixaba, que é acusado de lavagem de dinheiro. "Pelo amor de Deus, sim!", declarou Silas Câmara, que está sob investigação por falsificação de documentos e apropriação indevida de fundos públicos.

E sim, votou a grande maioria dos mais de 150 deputados que estão implicados em crimes, mas protegidos por seus status de parlamentares.

Por vezes a sessão expôs o lado da farsa da democracia no Brasil, tal como o Partido das Mulheres que tem apenas deputados do sexo masculino, ou o Partido Progressista Socialista, que é um dos grupos mais direitistas no Congresso.

O chefe de pessoal presidencial do Brasil Jaques Wagner disse que o governo estava confiante de que o Senado iria decidir contra o impeachment, insistindo que a votação foi um revés para a democracia, que foi "orquestrada" pelos oponentes de Dilma, que nunca aceitaram a vitória de sua reeleição em 2014.

Mas as chances de sobrevivência de Dilma parecem diminutas. O Brasil se virou radicalmente contra a primeira mulher presidenta do país. Uma vez uma das líderes mais populares do mundo, com classificações de 92% de aprovação, Rousseff viu seu apoio cair por terra como resultado da recessão econômica, da agitação política e da investigação da Lava Jato sobre a corrupção na Petrobras, a qual implicou quase todos os grandes partidos.

Vários altos funcionários do partido dos Trabalhadores foram presos em conexão com o escândalo e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está sob investigação. Como ex-ministra da Energia e chefa de seu partido, os críticos dizem que Dilma deveria saber o que estava acontecendo, mas ela não foi indiciada.

Pesquisas recentes sugerem que apenas 10% do público acha que a presidenta está fazendo um bom trabalho contra 60% que apoiam a sua remoção.

Mas muitos estão inquietos sobre os motivos duvidosos para o impeachment. Rousseff é acusada de promover contas de fachada do governo com uma transferência temporária de dinheiro de bancos estatais pouco antes da última eleição. Os que lhe apoiam dizem que esta infração é menor e comum, e está sendo usada como um pretexto de um "golpe" para tomar o poder por uma classe política que é notória por estar implicada em muito mais crimes graves. Cerca de um terço dos deputados da câmara dos deputados ou está sob investigação ou é acusado de crimes.

Na noite de domingo, os canais de televisão brasileira mostraram ruas cheias de manifestantes pró-impeachment que dançavam em comemoração. Muitos enrolados na bandeira nacional de um jeito que acabaram explodiindo em um coro do hino nacional. A cada declaração do congresso, as multidões gritavam e vaiavam como se estivessem em uma pantomima ou num jogo de futebol. Uma pessoa chegou a lançar um canhão confetti, enchendo rapidamente o ar acima dela de uma nuvem de cores brilhantes.

kingmaker (um fazedor de reis é uma pessoa ou um grupo que tem grande influência em uma sucessão real ou política, sem ser um candidato viável. Dignitários podem usar meios políticos, monetários, religiosos e militares para influenciar uma sucessão) é cotado para tomar o trono... mas vai o "golpe" de Temer dividir ou unir o Brasil?

Nas ruas, as multidões que se reuniram para mostrar apoio a favor ou contra o impeachment foram mais civis do que os seus representantes eleitos. Centenas de milhares de pessoas tomaram as ruas em mais de uma dúzia de cidades, a grande maioria delas se opondo ao governo. Do lado de fora do edifício do Congresso, em Brasília, os dois lados foram divididos por uma barreira de aço.

O lado anti-governo estava jubilante com a perspectiva de mudança. "Dilma tem roubado as pessoas com a corrupção e a inflação. Devemos nos livrar dela", disse Raquel Rosas, uma professora de escola que estava sentada em uma bandeira brasileira a espera do resultado com uma filha de 17 meses de idade e outros membros da família. "Mas nos livrar dela deve ser apenas o começo. Temer e Cunha deve sair também."

Do outro lado da cerca, a multidão era menor e mais suave. Algumas faixas furadas dizendo "Em Defesa da Democracia" e "Respeite o Meu Voto", em referência a dezenas de milhões de cédulas de votos a favor de Rousseff na última eleição que o impeachment ameaça derrubar.

Fabio Moura, um advogado de São Paulo, disse que estava enojado com a oposição, porque muitos deles têm sido implicados na investigação da Lava Jato sobre a corrupção na Petrobras. "Eles estão apenas tentando acusar Dilma para que possam parar a investigação", disse ele.

"Não é ruim para nós perder hoje. Isso significa que a oposição terá que fazer cortes de gastos impopulares e isso vai nos ajudar na próxima eleição", disse ele. "Mas este parece ser um péssimo dia para a democracia".

http://www.theguardian.com/world/2016/apr/18/dilma-rousseff-congress-impeach-brazilian-president

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