sexta-feira, 3 de junho de 2016

Folhas Secas

A coisa mais bela que vi na manhã da quinta-feira no caminho do estacionamento para o escritório foi um jardineiro soprando folhas com o soprador elétrico. Havia dois jardineiros limpando a pracinha em frente ao prédio do escritório, mas um deles estava lá na minha frente. O que me chamou a atenção não foi o jardineiro (!) mas as folhas que eu já vinha vendo de longe.

Aqui um soprador parecido com os que mencionei
Haviam muitas folhas naquele dia, porém atravessadas no calçadão em que eu caminhava, e ele estava tangendo elas para a direita, juntando-as, e tudo o que eu via era aquela montanha de folhas alaranjadas voando como num mini-tufão. A cena possuia uma beleza ímpar que aposto que ninguém notava nem se dava conta. Você enxerga Deus nestas pequenas cenas cotidianas...

O jardineiro estava todo trajado a rigor, a dizer, com suas roupas próprias no frio de 2 graus, calças de brim com casaco amarelo acrílico fosforecente para sua segurança de ser visto, como todas as roupas obrigatórias de operários ao ar-livre. O outro jardineiro estava a uns 10 metros de distância, limpando outro trecho no meio dos banquinhos nos escaninhos gramados e pavimentados, e este tinha barba grossa e preta. Eles fazem um par que trabalham juntos e ambos usavam tapa-ouvidos. O de barba usava um grande tapa-ouvidos vermelho, enquanto o outro usava um minúsculo branquinho. Notei isso porque os sopradores fazem um ruído ensurdecedor e eu estava imaginando como eles podiam trabalhar tão tranquilos com aquele barulho danado. Bingo, usavam tapa-ouvidos, talvez tocando música para a dança das folhas.

Aqui mais alguns sopradores parecidos, do blog do Samuel
sobre Canberra
Nesta semana que passou os jardineiros trabalharam muito, quase todos os dias, recolhendo toneladas de folhas mortas, caídas das árvores neste outono. As árvores estão quase totalmente peladas, fantasmagóricas, como ficam todo ano durante alguns meses. Eles tiveram que soprar esta quantidade de folhas durante vários dias, mas eu só notei naqueles últimos 3 dias porque eles estavam soprando na minha frente, no meu caminho, na minha hora de chegada, se bem que nos dias anteriores eles sopravam mais adiante, ou seja, o trabalho estava mais avançado. Acho que estavam atrasados naquele dia. 

Nem bem estou chegando, junto com um ou dois outros profissionais estranhos a entrarem no mesmo prédio, na mesma hora, o jardineiro louro nos viu de ladinho, e saiu da frente para nos deixar passar. Mas foi em direção à porta principal do prédio, atrás de um grande pátio descoberto. Fiquei imaginando porque ele foi se postar ali. É que ele ia soprar umas folhinhas que se encontravam naquele pátio para juntá-las ao molhe de outras folhas espalhadas na pracinha, então ele postou-se lá, esperou a gente passar para ligar a maldita máquina barulhenta de novo. Muito respeito ao transeunte, não é? A Austrália tem destas coisas, mas infelizmente nem todo mundo é bem treinado para valorizar o "cliente".

Aqui as folhas sopradas, mas imagine isso numa praça em frente a
um business center
Em super-mercados é comum a gente se deparar com funcionários abastecendo as prateleiras e atrapalhando todo mundo, fazendo pouco caso dos clientes. Eles não foram treinados para dar primazia a nós, os compradores, para saírem da frente, fazerem mesuras, oferecerem ajuda, e colocarem seus enormes carrinhos transportadores nos cantinhos, sem atrapalhar ninguém. Alguns chegam a deixar o carrinho atravessado, e as pessoas tem que empurrá-lo para tirarem do caminho e passarem, essa turma trabalhando claramente de mal humor. 30% dos trabalhadores que lidam com clientes na Austrália, pelo menos, são assim, mal educados, e alguns perduram por muitos anos. Mas não quando a gente os encontra, triste deles, porque denunciamos. Achamos sempre um jeito de denunciá-los, e a maioria é tirada do local de trabalho, mas não sabemos o que acontece com estas pessoas, só sabemos que resolvemos o problema temporariamente, até que novos contratados comecem tudo de novo, num ciclo vicioso que não termina nunca. Ora, afinal, tudo aqui é muito caro para ainda estarmos aguentando cara feia de quem quer que seja.

Pernas longas...
Toda vez que venho para o trabalho ou saio do trabalho, fico imaginando porque é que todo mundo anda mais rápido do que eu. Penso que tenho as pernas curtas, mas já vi gente mais baixinha do que eu andando mais ligeiro também. Penso que eles não gostam de apreciar a paisagem como eu que estou sempre olhando em volta, enquanto eles praticamente não olham para lugar nenhum, mesmo que não estejam operando seus brinquedos prediletos, os telefones celulares.

Suponho que todos estejam com pressa, mas estão sempre com pressa? Sim, pressa é uma forma de se desculpar para ignorar todo mundo, coisa que eles adoram fazer, que é a doença feia que abastece a alta taxa de suicídios. Só posso acreditar que suas pernas são mais longas do que as minhas, o que geralmente é verdade até para as mulheres, porque na Austrália tem muita mulher enorme, de mais de 1,80 m de altura, enquanto na minha área de trabalho tem muita soldada e militar que obviamente anda muito rápido para mostrar macheza e dinamismo, marchando mesmo sem ser necessário.

Desde cedo aprendi que uma forma de controlar o stress diário é curtir as coisas quando se está a caminhar e passar por elas, olhar para os lados, notar as coisas corriqueiras, captar o que é belo, se abstrair, admirar a paisagem e a natureza, pois mesmo nas vielas mais escuras e decrépitas se encontram plantinhas ou passarinhos a piar, pra se admirar. A felicidade é feita de uma coleção destas pequenas coisas... olhai o lírio dos campos...

O outono pode ser considerado bonito, mas ele me deixa triste como o por-do-sol, algo de bom e bonito que é efêmero e está indo embora para renovar-se mas só depois de um período de sofrimento "tenebroso" como o frio de Canberra que dura vários meses.

Mais ou menos assim, nada de telões curvos ainda, é bem
rudimentar...
Chegando no trabalho, esqueci de enviar email para minha mulher que reclamou. Daí eu expliquei o seguinte, eu pensei que já tinha enviado, mas quando fui ver, ele estava lá embaixo de uma pilha de papel... eletrônico.

Quem trabalha com muitas telas no computador ao mesmo tempo é assim. É como se você tivesse livros e 30 reportagens de jornais e revistas abertas ao mesmo tempo em duas mesinhas de centro na sala. Você pode imaginar isso? É como ter 30 papéis espalhados no seu birô e você escrevendo na metade deles e lendo a outra metade, tudo em conjunto e ao mesmo tempo. É assim o meu trabalho com informática na Austrália.

Naquele momento eu tinha 22 documentos abertos:

3 planilhas cheias de dados em várias folhas
5 documentos de rascunho onde anoto e acompanho as investigações de problemas
3 documentos do Word, incluindo um procedimento complicado pra seguir enquanto o atualizo
3 sessões de conexão com 3 servidores de dados do sistema
1 documento compactado aberto dando acesso a 10 outros que estão dentro dele os quais são parte de uma investigação
browser de internet com a ferramenta de gerenciamento de problemas, uma página de manual de usuário, um calendário esperto e o Google
2 diretórios diferentes com dezenas de arquivos cada um
2 diretórios do gerenciador de arquivos do cliente
1 gerenciador de emails com agenda e 2 entradas, emails para mim e emails para o grupo
1 chat

É mais ou menos assim, o que está aberto tem um ícone à esquerda, 
e o que pode ser aberto tem um mini-ícone do mesmo lado, porém 
lá em cima. Aprendi a usar assim olhando os clientes usuários...
Quando eu abro um email pra escrever pra ela no trabalho, ele pode ir parar atrás de todos esses documentos, me fazendo esquecer que escrevi e não mandei porque não havia terminado, se não escrever, terminar e mandar imediatamente. Senão, só vou descobrir quando sair fechando um por um todos os documentos. 

Quando alguém me interrompe, eu posso começar a fazer outra coisa pra atender, daí o email fica pelo meio do caminho. Interrupções podem ser via emails pra resolver na hora, via chat, ou pessoas que chegam perguntando coisas ou discutindo assuntos. Ou chegam as horas das reuniões. Pelo menos interrupções pelo telefone são bem raras pois detesto telefones que são muito invasivos e soberanos, você tem que parar tudo para atendê-lo já que também detesto escutar e deixar mensagens, não uso estas coisas e assim consigo manter minha humanidade e sanidade mental.

Você não se hipnotiza com uma cena
destas de verdade? Pois devia... amar

é admirar as pequenas coisas.
Aquela barrinha onde ficam os controles do browser no PC da minha mulher, lá embaixo, no meu caso, na vertical, mostravam 22 ícones naquele momento, ou seja, 22 documentos ou diretórios abertos. Costumo trabalhar com mais do que isso ao mesmo tempo, mas aquela foi uma boa média. Por isso minha barra fica colocada verticalmente, para caber tudo, um em cima do outro e não embaixo com um ícone ao lado do outro. Além disso tenho uma outra barrinha com ícones pequenos que são para acessar cada coisa que utilizo regularmente, então lá se encontram mais de 100 ícones, e eu sei cada um onde vai dar e o que vai me abrir. Senão eu tenho que procurar cada documento ou diretório nos arquivos de pelo menos 3 servidores só de documentação em geral, os quais não tenho a menor noção da quantidade, mas são milhares, e praticamente me tomariam metade do dia só pra isso. 

Apesar de ter manuais e procedimentos impressos em minha mesa e estante, eles em geral são desnecessários, exceto em algumas circunstâncias, como por exemplo, quando os eletrônicos ficam em outra rede acessada por outro computador que não é o meu, mas quanto ao resto, é tudo eletrônico, não tenho nada, só um minúsculo caderno de notas porque ainda não migrei para o tablete. Meu caderno de notas é só para certas reuniões, e é menor do que o de todo mundo. Prefiro não depender de um tablete ainda, apesar de ver algumas pessoas pilotando eles em reuniões. Tablete de uso diário só o de chocolate... E também procuro não me tornar escravo do meu smart phone, que já está smart demais para o meu gosto (esperto). Mas quanto mais eu corro e evito a tecnologia, mais ela me alcança.

Centro de Canberra, capital da Austrália, no outono
O caminho para o trabalho é belo, a cidade é arborizada com esmero e técnicas de botânica, alternando as cores das folhas conforme as épocas do ano, as pistas perfeitamente pavimentadas, com todas as faixas e placas de trânsito, e tudo é tão organizado como dificilmente veríamos no Brasil, nem mesmo em Alphaville, São Paulo, aquele bairro em que outro dia filmaram dezenas de Ferraris estacionadas nas ruas do condomínio fechado mais chique e tradicional daquela cidade para divulgar o acinte e o ultrage dos milionários perdulários numa época de democratização da riqueza mundial. Porém, neste paraíso materialista que é a Austrália, falta... alma!

É isso o que falta no australiano, alma. O que fazer para esse povo não se suicidar com tanta frequência? O que fazer para eliminar a violência doméstica? Acabo de ser convidado para o lançamento de um livro de uma artista amiga nossa cujo assunto é justamente esse. Ela é uma heroína que sobreviveu a este tipo de relacionamento familiar tão comum neste país, e agora eu vou ler sua vida publicada para a humanidade ver se aprende algumas lições sobre como dominar e erradicar a violência doméstica que não devia existir neste estágio da humanidade e muito menos num país como este que todo mundo considera a perfeição na Terra.

Choques Globais

E por falar em aprender lições, veja esta lição que foi dada no gogó de certas pessoas por David Miranda, repórter brasileiro do The Guardian, João Roberto Marinho me Atacou no Guardian e Tentou Enganar o Mundo, Eis Minha Resposta:

https://theintercept.com/2016/04/25/joao-roberto-marinho-me-atacou-no-guardian-e-tentou-enganar-o-mundo-eis-minha-resposta/

Isso você não vai ver na Globo...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentários são moderados para evitar a destilacão de ódio que assola as redes sociais, desculpem.